domingo, 3 de janeiro de 2010

Consumindo afetos e alugando laços emocionais



Na modernidade estão imbuídas características paradoxais, como a transitoriedade e o imutável, na medida em que, simultaneamente, a dinâmica das transformações históricas ganha terreno e o homem busca um saber racional, perene e universalizante.(...)

(...) A sociedade pós-moderna organizada em torno do consumo basta-se sem normas, é orientada pela sedução, por quereres voláteis e desejos crescentes. O principal da vida diz respeito a estar sempre pronto, a ter a capacidade de aproveitar a oportunidade quando ela se apresentar, a desenvolver novos desejos para as novas seduções que serão sempre indispensáveis. Há uma crescente mercantilização de todos os domínios da experiência humana. De fato, o sujeito cede à lógica mercantil e consumista dos territórios outrora privatizados de seu corpo e sua “alma”, seu mundo interior: esforça-se em tornar seu corpo o espelho dos modelos vendidos como perfeitos e idealizados, enquanto sua “alma” vaga dos psicofármacos aos livros de autoajuda, do programa mediático de TV ao redemoinho alienante da indústria do entretenimento, em busca de alguma paz ou anestesia, hoje quase sinônimos.(...)

(...) Os espasmos de proximidade virtual terminam, idealmente, sem sobras nem sedimentos permanentes.” O espaço da virtualidade brinda ao sujeito com a possibilidade da proximidade distanciada, limitada, controlada. Aliás, a exigência de habilidades decorrentes das vivências de permanência ou de intimidade parece ser um problema a ser evitado.(...)

(...) Os recursos farmacológicos prometem a cura sem esforço, trata-se de equilibrar os níveis de determinadas substâncias químicas produzidas pelo organismo biológico, evitando qualquer modalidade de padecimento e, isso tudo a qualquer custo, até mesmo o da dessubjetivação. O sujeito parece não precisar mais “implicar-se” em seu próprio padecimento (...)

(...) nessa imagem social construída para o sujeito, não existe lugar para afetos humanos básicos: a angústia e a tristeza são banidas do ideário pós-moderno e, a qualquer sinal de sua proximidade, o indivíduo deve acessar dispositivos para sedá-las - antidepressivos e drogas as mais diversas.(...)

Fragmentos extraídos da revista Psicol. Argum. 2008 jul./set., 26(54), 217-224

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