quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Tempo Atemporal, Tempo Volátil, Tempos Sombrios.

Lembro de meu pai contando que meu bisavô, no Líbano, costumava plantar sementes de tâmaras.Um pé de tâmara para crescer e dar frutos leva mais de cem anos.Meu pai, certa vez, perguntou, porque ele plantava as sementes.Ele respodeu algo mais ou menos assim: “ora, como é que meus netos e bisnetos vão comer tâmaras se alguém não plantar?”

Lembro da minha mãe, quando tínhamos uma vida humilde, confeccionando minhas roupas.Eu ajudava ela a cortar os tecidos.Depois tinha que experimentar para fazer os ajustes finais, para que o caimento da roupa ficasse perfeito.

Recordo que enviava cartas para primos e primas pelo correio e , quando o carteiro chegava, eu ia correndo ver se alguma carta era para mim.

Acreditem (pelo menos os que tem menos de 30 anos) isso não faz tanto tempo não.Os tempos mudaram.E de forma muito rápida e radical, a ponto de afetar nosso modo de ser e viver.

Hoje somos impacientes: ficamos irritados com internet lenta; quando a fila de um fast food está grande ou quando não gostamos daquela roupa que vimos na vitrine depois que experimentamos.Quando o celular do outro lado demora a atender.

Não temos tempo mais para estudar.Ler livros é perda de tempo.Exceto os ditos “livros de auto-ajuda”, onde muitos procuram buscar soluções para seus sofrimentos e a busca imediata da felicidade.Não há tempo para olhar dentro de si.Não há tempo para reflexão.

Já se foi o tempo de ler os grandes clássicos da literatura; poucos se interessam pelos autores nacionais como Machado de Assis, Drummond, Mário Quintana, Clarice Lispector, ou mesmo os internacionais como Goethe, Dostoievski, Hannah Arendt, Tolstói. Eu até me envergonho de citá-los.Me envergonho de dizer que nunca assisti a um Big Brother Brasil.

Para ler tais livros, é preciso tempo.Tempo para assimilar o que jaz na tecitura de cada texto, o que intenciona o autor com aquelas palavras e cenas imaginárias.

Tempos de um mundo que hoje, em parte, é virtual.Pessoas que se relacionam sem nunca terem se visto e adquirem uma intimidade via internet tão rápida, tão volátil e ao mesmo tempo, tão intensa.

Tempos de busca de uma medicina que cura dos males da alma.Cápsulas e comprimidos que extirpem o mais rápido possível a tristeza, a angústia, a dúvida, o medo, muitas vezes confundidos com depressão e síndrome do pânico.

Confesso que às vezes me sinto uma velha num corpo jovem.Meus melhores amigos tem, a maioria, o dobro da minha idade.Eu sou uma contemporânea que vive num outro tempo simultâneo a este.Acreditem, é um desafio diário.Mas não tenho tempo de pensar nisso.Por isso adotei a filosofia do “uma coisa de cada vez”.Pode não ser a mais eficiente para os tempos atuais, mas é o que funciona para mim.

ANJO NEGRO

Respeitem os direitos autorais deste texto.

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